Se amanhã me fosse
Se amanhã me fosse como viveria o dia de hoje? Se amanhã me fosse hoje ao acordar sorriria olhando para os orifícios da janela que deixam entrar luminosos raios de luz dourada. Alongar-me-ia tal felino sentindo todo o meu físico e a sua simbiose com o vácuo circundante. Tomaria um banho onde sentiria a água em contacto com a minha pele e o som musical da percussão da gotas no chão da banheira. Uma refeição leve, natural, antes de sair em direcção à praia. Pelo caminho os odores variados far-me-iam sentir vivo como nunca, cheiros da natureza imensos. Meus olhos captariam cada pormenor, cada movimento: de vento sobre os ramos; das borboletas; dos pássaros; do avião que cruza os céus lá bem no alto. Ao chegar à praia tiraria as sandálias e o tacto com a areia macia massajar-me-ia a planta dos pés, prolongando-se esse prazer por todo o corpo até desembocar num arrepio no alto da cabeça. O sol aquecer-me-ia o corpo. Deitando-me no areal seria somente sensações: vendo o céu azul, com breves pinceladas brancas; ouvindo o mar ali tão perto comunicando comigo com o seu bater de ondas; cheirando o odor salgado e de maresia, autentica aromaterapia; o paladar do ar fresco trazido pelos ventos atlânticos, que se misturam com os sabores terrestres; o tacto da areia em todo o corpo, o seu calor e simplicidade, leito perfeito.
Se amanhã me fosse hoje viveria.
Viver não é ter mas sim ser, ser natural na mais pura essência, ouvindo o clamor da natureza, comunicando com ela, ouvindo-a e brincando. Amando-a, deixar-se amar e abraçá-la. Correr no areal da praia até à exaustão, cair, rebolar até à água e ser envolvido por uma onda. Um breve contacto com o subaquático e voltar à superfície nadando como que acariciando as águas, deixando-se transportar por elas de novo para a areia molhada, onde de braços e pernas estendidos olharia o céu, com uma lágrima solta, salgada como as gotas de mar que lhe fazem companhia. Sorrir, gritar de alegria e beijar o céu.
Se amanhã me fosse hoje seria eu, sem máscaras, sem condicionalismos externos, sem mim. Seria eu desprovido de tudo o que é meu, seria alma, seria sentimento, seria amor.
Se amanhã não me for hoje tentarei viver como se me fosse.
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